sábado, 19 de dezembro de 2020

HOJE, 19 DE DEZEMBRO : DIA DO NASCIMENTO DO POETA MANOEL DE BARROS

 

O poeta Manoel de Barros já passava dos 80 anos quando um editor pediu que ele escrevesse três memórias: da infância, da vida adulta e da velhice. Imaginava o editor que o longevo poeta teria  muito a falar de si, sobretudo de seus prêmios , sucesso e  fama ( que vieram para Manoel somente após idade avançada). Talvez se esperasse que Manoel  , numa volumosa  “Memória da Velhice”, desse  conselhos e proferisse palavras de sabedoria nascidas de sua  avançada idade.

Depois de algum tempo, o poeta enviou ao editor o seguinte livro: “Memórias da primeira infância”, um livro maravilhoso , livro da “verdez das coisas”. Meses depois, o poeta deu à luz nova publicação: “Memórias da segunda infância”, um rejúbilo , um “ir à origem que renova”.  Após novo intervalo, outra obra nasceu: “Memórias da terceira infância”, livro de “natências”  , reinvenções , horizontamentos. Como as memórias da vida adulta e sobretudo da velhice não apareciam, o editor tomou coragem e indagou Manoel a respeito, e assim o poeta respondeu: “ só tive infância, não tive velhez. Só narro meus nascimentos”.

 A palavra “velhez” é uma invenção do poeta, um neologismo. “Velhez” não é uma idade, “velhez” é quando os dias vividos se tornam um peso curvando as costas, não importando a idade que se tenha. “Velhez”   é a  vida  prostrada, de joelhos, sem forças para caminhar e avançar. Às vezes, é a própria sociedade que sofre de “velhez” : quando seu futuro , ainda nem chegado, já parece extinto...

“A única coisa que carrego é meu chapéu: moro debaixo dele”, explica-se o andarilho-poeta. “Chapéu” é como Manoel nomeia as ideias que protegem os pensamentos que dão caminho às pernas : “O poeta-andarilho abastece de pernas as distâncias”. Sobre o  chapéu do poeta  um casal de pardais fez um ninho: há nele ovos sendo chocados, assim como dentro do poeta  dias novos.

O poeta também diz que  "velhez" é um tipo de vida  que se perdeu de seu "embrião", de seu começo e “minadouro” . O embrião nunca  está num passado remoto e morto. Mesmo o imenso rio amazonas tem seu embrião lá no alto dos Andes: mesmo há muitos anos a correr , o rio ainda está a nascer agora, umbilicado às águas novas. O que para o rio são as águas, para o poeta são as fontanas palavras de seu “devir-criança”: “A palavra até hoje me encontra na infância ; não avanço para o fim, avanço para o começo: para a Origem que renova ” (Manoel de Barros).






E ontem se foi Dona Stella Barros, esposa e companheira do poeta. Se na ponta do lápis do poeta havia tanta vida, é porque sobre a mão dele, enquanto ele escrevia, havia também a mão de Dona Stella. Ela se foi na véspera do dia em que Manoel chegou; porém  os dois se encontraram , para nunca mais se separarem, em cada poema que o poeta criou, sempre afirmando e celebrando a Vida.



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