sábado, 23 de fevereiro de 2019

as ruas


Os gregos inventaram a “ágora” , a praça pública, como espaço-símbolo  da democracia.  “Ágora”  vem de “agon” : “conflito”  ou “disputa”. Na ágora aconteciam disputas  travadas com palavras.  Os romanos, por sua vez,  inventaram as ruas. Não como espaço político,  mas como meio de travessia   para além dos muros das cidades:  as ruas atravessavam  espaços livres e  não povoados.
A Revolução Francesa se inspirou no ideário da praça como espaço de poder a se contrapor aos templos da intolerância religiosa  e aos castelos dos senhores feudais. Surgem então os “parlamentos”: lugar onde se “parla”.  Radicalizando ainda mais a ideia de democracia, Espinosa dizia que mais importante do que a praça é a rua   como espaço comum onde a multitudo se move e age.  “Multitudo” é mais do que a mera “multidão”: multitudo é o agir   instituinte de uma multiplicidade ativa. A multitudo nunca cabe totalmente no espaço centrípeto das praças, pois somente no espaço centrífugo das ruas cabe o existir em movimento da multiplicidade política, cuja potência excede o poder de governos e Estados: enquanto a  força destes é a da mera polícia,   a potência da multitudo é o desejo comum por justiça e democracia. Da praça nasceu o parlamento para se opor aos templos e castelos. Mas quando o próprio parlamento se torna sucursal do templo teológico-político e de   mentalidades medievais encasteladas, somente as ruas podem nos restituir a liberdade que nos roubaram as urnas algemadas.  As praças simbolizam o centro das cidades, porém as ruas alcançam também as margens, conectando aqueles a quem o poder centralizador exclui e marginaliza.



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