sexta-feira, 14 de setembro de 2018

livro por vir


 LIVRO POR VIR

                I 
               
O livro tinha apenas páginas em branco:
era um livro para des-ler.
Fui para ele apresentando o mundo,
para ele o aprender.

Ele quis saber o que era o sangue correndo.
Disse-lhe: não se pode escrever.
Ele quis saber o que era dor, amor, alegria.
Disse-lhe: só se pode viver.

O livro já não tinha apenas páginas agora,
ele tinha dias:
cada nova história dele coincidia
com o tempo novo do amanhecer.






                   II

Tirei os livros da biblioteca empoeirada
e sai com eles para deambular e ver gente.
Partimos em bando, sem centro ou comando:
poemas, e não celulares, eram nosso guia e mapa.
Fomos à Lapa, Madureira, Maracanã - por dentro e por fora.
Na Lapa, Baudelaire se encantou com uma poeta de rua
que lhe mostrou  que nas flores não há mal.
Em Madureira, Nietzsche quis aprender capoeira :
retirou  o paletó e a indumentária ariana,
retirou também a pele branca
e ficou apenas vestido com a mesma alma suburbana
que os capoeiristas também vestiam.
Rimbaud subiu a Mangueira e , lá de cima, entrou no céu sem bater.
Espinosa, este, sempre o mantive ao meu lado,
parecia que ele já conhecia aqueles lados          
onde mora o povo   excomungado pelo poder.









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