terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

ordinário, extraordinário



Manoel define sua poesia como uma “Estética da Ordinariedade”. “Ordinário” significa a mesma coisa que “comum” ou “regular”. À ideia de “ordinário” costumamos opor a noção de “extraordinário”. Vale a pena lembrar a origem matemática desses termos. Na matemática, os “pontos ordinários” de um triângulo são os inumeráveis e indistintos pontos que ocupam cada um dos lados da figura, ao passo que seus três “pontos extraordinários”, ou “singulares”, localizam-se em cada ângulo do triângulo. Em uma reta, por sua vez, os pontos extraordinários são dois: os que ocupam os extremos da linha.
Todavia, a diferença entre ordinário e extraordinário mostra toda a sua riqueza quando examinamos o círculo. Tal figura geométrica parece destituída de pontos extraordinários ou singulares. Mais do que uma linha reta, geralmente costuma-se afirmar que nossa vida é um círculo: o círculo de nossa vida. Então, estaria o círculo de nossa existência destituído de momentos singulares? Estaria nossa vida refém do ordinário?
Mas o círculo guarda um segredo, tanto na matemática como na vida: qualquer ponto ordinário seu pode metamorfosear-se em ponto extraordinário, se por ele passar uma “tangente”. No encontro da tangente com o círculo, ambos dividirão o mesmo ponto, abrindo assim o círculo a uma força que vem de fora de seus limites e contornos. Quando o ordinário se converte em extraordinário, “desabre” um novo sentido.
Assim, entre o ordinário e o extraordinário não existe uma diferença intransponível: é no seio do ordinário que o extraordinário acontece. “Cada coisa ordinária é um elemento de estima” :“é no ínfimo que eu vejo a exuberância”, afirma o poeta. É preciso reinventar tangentes...



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